quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Crônica de uma morte anunciada.

Primo Zé.
Era tanto amor no peito que o coração não agüentou.
Viveu 26 anos com tanto vigor e ‘saúde’ que nem os amigos sabiam que dentro dele tinha um marca-passo para controlar e segurar quando a emoção fosse grande.
Era só uma visita de rotina. Entrou, sorriu pros que estavam no corredor e disse pro médico, que tinha acabado de lhe dar uma bronca por passar tanto tempo sem se consultar, para que não se preocupasse que ainda não era hora de se livrarem dele.
Antes de o doutor dar o diagnóstico o primo Zé caiu no chão, o peito tinha explodido de amor e se espalhando na sala que todos, mesmo aflitos, puderam sentir.
Levado as pressas para a UTI começava assim a semana que antecipava o aniversário da prima que fez parte daquela infância tão peralta e que desde festa de entrada de ano não se viam, não ouvia aquele magrelo com a testa de aparar raio (herança da família) chegar à casa da vó falando:
- Velha, tu já tá se danando ai nesse quintal, né?
A vó achava graça e amava aquele neto, como ama todos os outros. Mas com ele era um amor mais especial, a família sabia que o coração um dia o trairia, só não sonhava que seria antes de ver o primeiro filho crescer.
Quem poderia prever quando era que aquele punho fechado ’ bombeador ‘ de sangue ia resolver descansar? Se soubessem talvez mais perto dele todos tivessem estado até o último dia.
O primo Zé que tinha a voz desafinada surpreendeu quando cantou pra esposa a canção que ela mais gostava numa igrejinha lotada no dia do casamento, todo mundo se orgulhou. O choro não se pôde evitar, embora casamentos fossem sinônimos de emoções exacerbadas para alguma escritora clichê, aquela imagem ficou intacta.
Primos, os irmãos de quem é filho único.
As danações que deixam mães, tias e vó com o cabelo branco bem mais cedo (herança de família 2) do que deveria eram expostas na mesa da sala de janta que mesmo pequena acolhia todos. Mesmo que breve aqueles domingos em família, que hoje se resultaram em datas comemorativas, servia para isso, para que os primos se juntassem na casa da vovó com todo aquele barulho, com aquela confusão gostosa que sempre dava uma sensação de felicidade completa quando dava 3 da tarde e todos resolviam ir embora.
Mas ninguém deixou de lembrar como foi bom terem vivido a infância juntos, inclusive lembrar-se do dia que ataram a rede e foram brincar de barco em alto mar:
-Balançando 1, balançando 2, lá vai o barco! Não! Não entra Zé, tu é grande, vai rasgar, vai rasgar!
E todo mundo caiu de bunda no chão e deu aquela gargalhada gostosa, gargalhada essa dada com o coração, corações que mesmo que se juntassem todos os primos não caberia todo o amor que o primo Zé tinha no coração grande.

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